quinta-feira, 2 de julho de 2009

Bicicleta

Descobri-me igual a mim mesmo aos 11 anos de idade, moleque atrevido, transportei-me para aquelas manhãs geladas de junho, flanava de caloi vermelha pelas ruas ocas de Brasília, ao som de Aerosmith. Pensava na minha primeira ex-namorada, déspota da minha adolescência e das minhas incursões iniciais no corpo feminino, essa carne sagrada que, para um menino, constitui a prova suprema de generosidade divina para os pecadores desta terra. Começava a sentir ali as asperezas da pedra-pomes do amor. Não era uma dor feita somente de sofrimento; havia nela o prazer de me sentir em mim, aquela sensação era o meu berço, embalava sonhos confortáveis de plenitude, da união entre os pedaços de tudo que me constitui, sentimento de autossuficiência, de que aquela dor me bastava e eu bastava a ela, nós dois juntos, na comunhão entre o meu ser e toda a verdade sobre ele, num lugar onde não há finitude, incerteza, consciência ou desespero - apenas a serena satisfação de estar no mundo, de que tudo está como sempre foi e sempre deverá ser.

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